a) Um olhar sobre a realidade
Cardeal Orani João Tempesta - Arcebispo do Rio de
Janeiro
O Brasil atravessa um difícil momento de crise
política, institucional e ética, que não deixa indiferente ninguém de nós. Ao
contrário, pede-nos oração e reflexão. Se de um lado há um despertar das
pessoas para agir na sociedade, de outro há também situações de conflitos
preocupantes. Ao querer o bem do país, devemos procurar fazê-lo bem também.
Em tempos de tantas situações anômalas e tensas, ao
mesmo tempo em que nos cabe manifestar nossas opiniões, somos chamados também a
encontrar caminhos de solução. Eis o grande desafio que se impõe nesse momento
à nossa pátria!
Em tempos como estes, os homens da Igreja são
chamados a dar uma palavra de apoio e incentivo a todos os filhos e filhas
desta amada nação que – queiramos ou não – nasceu sob o signo da Cruz do único
e divino Redentor do gênero humano. Ele, sem deixar de ser Deus, se fez homem
igual a nós em tudo, menos no pecado, na plenitude dos tempos (cf. Gl 4,4). A
história é inexorável. Pode ser reinterpretada, nunca, porém, negada por quem
quer que seja.
Essas raízes religiosas dão base à unidade nacional
de Norte a Sul, de Leste a Oeste, sempre dentro do respeito às diferentes
denominações religiosas ou mesmo às pessoas ou grupos que afirmam não ter
religião. É a unidade nacional na pluralidade de pensamentos. Isso constitui um
Estado que se confessa laico no sentido exato do termo, mas não laicista, ou
seja, aquela Nação que, sob a aparência de laicidade, persegue as instituições
não concordes com o seu modo de pensar ou, pior, com a linha ideológica do seu
governo. Isso caracterizaria um tipo de intolerância que o próprio povo jamais
toleraria.
É certo, como a Igreja entende desde o distante
pontificado do Papa Leão XIII (1878-1903), que a chamada questão social jamais
será resolvida se nos esquecermos dos valores humanos e evangélicos, pois ela é
uma questão do homem e da mulher dos nossos tempos com fome e sede do Absoluto
ou de Deus, sem o qual tudo o mais parece sem sentido. Daí dizer aquele Papa o
seguinte: “Alguns professam a opinião, assaz vulgarizada, de que a questão
social, como se diz, é somente econômica; ao contrário, porém, a verdade é que
ela é principalmente moral e religiosa e, por este motivo, deve ser resolvida
em conformidade com as leis da moral e da religião”. (Encíclica Graves de
communi, 18/01/1901).
Em outras palavras, seguindo a sabedoria bimilenar
da Igreja, não se pode fazer verdadeira reforma social sem, antes de tudo,
transformar o coração humano em um coração que ama o próximo antes de amar a
si. Mais: faz isso por amor de Deus e não por mera filantropia. Qualquer
reforma social que não parta da própria reforma interior de cada um de nós está
sujeita aos mais vergonhosos fracassos, como já ficou comprovado em diversos
países que tentaram destronar Deus para colocar em Seu lugar qualquer outra
coisa ou pessoa no campo social e político.
Um dos princípios básicos de todo povo civilizado,
que se preze de ter esse adjetivo, tem de ser o respeito à vida desde a sua
concepção até o seu natural ocaso. Afinal, que credibilidade teria quem
dissesse defender os mais fragilizados, mas advogasse – inclusive oficialmente
em um programa político ou legislativo – a morte dos mais inermes e indefesos,
como são os nascituros no ventre de suas mães? Ainda: como poderia ser chamado
de civilizado um país no qual é roubada a dignidade de viver dos idosos a
cambalearem pelas filas de alguns órgãos públicos de saúde ou mesmo em hospitais
ou instituições semelhantes?
Como poderia ser tida por avançada uma sociedade
que, por meio de suas autoridades maiores e contra o sentimento do povo,
investisse pesadamente contra a família, célula mãe da vida social e cultural?
É na família que se aprendem os primeiros passos da fé, da honestidade, da
partilha (e não do tirar vantagem, especialmente com o que é do outro), do
amor, enfim, dos valores humanos e cristãos necessários para a vida saudável em
comunidade. Tentar quebrar essa instituição querida por Deus é desejar destruir
a sociedade a partir de seus alicerces.
Ora, sem o respeito à religião, à vida e à família
não se pode, de modo algum, construir uma sociedade verdadeiramente próspera e
respeitável. Todos os artifícios de progresso serão uma quimera, que cedo ou
tarde acabarão por ruir. Seu alicerce está sobre a areia movediça e não sobre a
Rocha firme que é Deus, criador de tudo e desejoso do bem dos seus filhos e
filhas. Os caminhos que não respeitam a fé do povo e seus valores acabam por desencadear
em situações irrespiráveis.
A falta de ética na vida pública, especialmente no
exercício de um mandato público eletivo, neste caso, é mera consequência. É
triste, mas não assusta a quem reflita um pouco. Sim, se não se respeita a fé
alheia, a vida, a família etc., que se pode mais esperar? O triunfo ou o
fracasso? Esperemos que não seja necessário cantar como a ópera Nabucco de
Verdi: “Ó minha pátria, tão bela e perdida”, que foi o hino patriótico dos
italianos no final do século XIX. Mas o Salmo a que isso se refere (137) coloca
sua confiança no Senhor: “Lembra-te, Senhor!”
Ausente de Deus, na prática a pessoa se julga um
deus acima de tudo e de todos, e exige para si prerrogativas especiais acima
dos demais seres humanos comuns. É a loucura de alguns governantes que, ao
longo da história, atribuíram a si mesmos, inclusive, poderes divinos, ou se
faziam adorar pelo povo.
Haverá espaço para a ética aí, a não ser aquela
“ética” que leva a tirar vantagens de tudo em nome dos que mais necessitam e,
pior, à custa deles? A lei, no caso, será igual para todos, menos para alguns
privilegiados? Teríamos dois pesos e duas medidas: na hora que convém,
invocar-se-ia a Constituição do País, quando não convém, se fariam críticas
ferrenhas a essa mesma Lei Maior? Lembremo-nos, porém, de que o comum não é o
normal na vida das pessoas. O sonho desmedido e perpetuado de poder não combina
com democracia e com progresso em nenhuma parte do mundo.
Um Estado que se pretendesse totalitário, sufocador
e abocanhador das demais instituições, não conseguiria prosperar a não ser pelo
império do medo e das ameaças, ou jogos sujos de atirar uns contra os outros e
enquanto esses menos avisados brigassem aqui embaixo, os poderosos continuariam
imunes lá em cima, usufruindo dos benefícios lícitos que o cargo lhes dá ou dos
ilícitos tirados especialmente dos mais necessitados. Necessitados que esses
homens e mulheres públicos tanto diriam defender.
Passando ao Brasil, em especial, devemos dizer que
o momento é grave e requer o despertar e o aliar-se de todas as forças vivas da
Nação, a fim de, juntos, dizermos um forte e rotundo “Não” à corrupção, venha
ela de quem vier e de que esfera ou natureza for. Não se podem sacrificar os
valores éticos e morais, nem se podem espezinhar os benefícios ao povo sofrido
como saúde, moradia, educação, saneamento básico. Afinal, sempre é o povo
humilde o mais atingido em meio a esse turbilhão de coisas, que desde algum
tempo vem se abatendo sobre o Brasil.
Essas mesmas forças vivas da Nação precisam dizem
“Sim” à união de todos os homens e mulheres, independentemente de seu time de
futebol, da sua cor de pele, da sua condição social ou de quaisquer outras
pequenas diferenças acidentais, a fim de que o mal seja combatido com
seriedade, dentro da lei e da ordem e, sobretudo, sem ódio ou revolta contra
quem quer que seja, nem luta entre classes. Somos todos irmãos em Cristo Jesus!
É hora de mantermos a unidade nacional, a fim de,
unidos, vermos o triunfo do bem nesta Terra de Santa Cruz. Portanto, irmãos e
irmãs, que todos nós – católicos, cristãos ou homens e mulheres de boa vontade
em geral – apoiemos a melhoria desta grande Nação brasileira de modo firme,
mas, ao mesmo tempo, cordato e pacífico, sem ódio ou incitações a revoltas. Já
temos violência demais! E, assim, Deus nos abençoará com as mais copiosas
graças celestiais.
Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil, mãe
de Jesus, o príncipe da Paz, e também nossa mãe (cf. Jo 19,25-27), dado que
somos filhos no Filho (cf. Gl 4,5), intercederá sempre por nós, sobretudo nesta
hora decisiva ao povo brasileiro. Amém!
b) Bispos brasileiros se reunirão na 54ª Assembleia Geral
A 54ª Assembleia Geral (AG) da CNBB acontecerá no período de 6 a
15 de abril, no Centro de Eventos Padre Vítor Coelho de Almeida, em Aparecida
(SP). Este ano, o tema central será “Cristãos Leigos e Leigas na Igreja e na
Sociedade – Sal da Terra e Luz no Mundo”.
Entre os temas prioritários previstos, segundo
informou o site oficial da CNBB, estão a “Liturgia na Vida da Igreja”, a 14ª
Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, a conjuntura político-social,
a mensagem “Pensando o Brasil: crises e superações” e as mudanças do quadro
religioso no país.
São esperados cerca de 320 bispos ativos e
eméritos, dos dezoito regionais da CNBB. Diariamente, os trabalhos da
Assembleia Geral iniciam com celebração da missa com laudes, das 7h30 às 8h45,
no Santuário Nacional de Aparecida, com transmissão ao vivo pelas emissoras
católicas de rádio e televisão.
A reflexão do tema “Cristãos Leigos e Leigas na
Igreja e na Sociedade – Sal da Terra e Luz no Mundo” foi iniciada em 2014,
durante a 52ª Assembleia Geral da CNBB.
Jornal Online “A Voz de Lourdes” – Abril de 2016
Responsabilidade: PASCOM Paróquia Nossa Senhora de Lourdes - Vila Hamburguesa - SP
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