AS CONFISSÕES
A Necessidade da Compaixão
Arrebatavam-me
os espetáculos teatrais, cheios de imagens das minhas misérias e de alimento
próprio para o fogo das minhas paixões. Mas porque quer o homem condoer-se,
quando presencia cenas dolorosas e trágicas, se de modo algum deseja
suportá-las? Todavia, o espectador anseia por sentir esse sofrimento que,
afinal, para ele constitui um prazer. Que é isto senão rematada loucura? Com
efeito, tanto mais cada um se comove com tais cenas quanto menos curado se acha
de tais afectos (deletérios). Mas ao sofrimento próprio chamamos ordinariamente
desgraça, e à comparticipação das dores alheias, compaixão. Que compaixão é
essa em assuntos fictícios e cénicos, se não induz o espectador a prestar
auxílio, mas somente o convida à angústia e a comprazer o dramaturgo na
proporção da dor que experimenta? E se aquelas tragédias humanas, antigas ou
fingidas, se representam de modo a não excitarem a compaixão, e espectador
retira-se enfastiado e criticando. Pelo contrário, se se comove, permanece
atento e chora de satisfação. (Confissões).
Bem e corrupção
Vi
claramente que todas as coisas que se corrompem são boas: não se poderiam
corromper se fossem sumamente boas, nem se poderiam corromper se não fossem
boas. Com efeito, se fossem absolutamente boas, seriam incorruptíveis, e se não
tivessem nenhum bem, nada haveria nelas que se corrompesse. De facto, a
corrupção é nociva, e se não diminuísse o bem, não seria nociva. Portanto, ou a
corrupção nada prejudica - o que não é aceitável - ou todas as coisas que se
corrompem são privadas de algum bem. Isto não admite dúvida. Se, porém, fossem
privadas de todo o bem, deixariam inteiramente de existir. Se existissem e já
não pudessem ser alteradas, seriam melhores porque permaneciam incorruptíveis.
Que maior monstruosidade do que afirmar que as coisas se tornariam melhores com
perder todo o bem?
Por
isso, se são privadas de todo o bem, deixarão totalmente de existir. Logo,
enquanto existem são boas. Assim sendo, todas as coisas que existem são boas e
aquele mal que eu procurava não é uma substância, pois se fosse substância
seria um bem. Na verdade, ou seria substância incorruptível, e então era
certamente um grande bem, ou seria substância corruptível, e nesse caso, se não
fosse boa, não se poderia corromper.
Jornal Online “A Voz de Lourdes” – Agosto de 2017
Compilação e Edição: Sérgio Bonadiman - Revisão e Publicação: Dermeval NevesResponsabilidade: PASCOM Paróquia Nossa Senhora de Lourdes - Vila Hamburguesa – SP
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