segunda-feira, 4 de julho de 2016

REFLETINDO COM SANTO AGOSTINHO

SOBRE A UNIDADE NA IGREJA


Unidade

Um elemento muito presente nos sermões pascais de Santo Agostinho com relação à Eucaristia é a unidade. Santo Agostinho viveu numa Igreja que se encontrava dividida, principalmente por causa do cisma donatista. Ele será, por isso, um grande amante da unidade e da paz da Igreja e usará, diversas vezes, da imagem do Pão e do Vinho eucarísticos para falar da unidade. Como o pão não se formou de um grão só, nem o vinho de um único racimo de uva, assim também, em cada comunidade, há muitas pessoas. Para que haja a unidade entre elas, contudo, é preciso que morra o próprio 'eu', para que possa nascer o 'nós'.

Santo Agostinho usa da imagem do moinho para ilustrar as penitências, que levam os fiéis a "moer-se" para morrer a si mesmos e unir-se aos demais, exatamente como ocorre com os grãos de trigo no moinho, e para entrar em condições de unir-se pela ação do Espírito Santo, pois o Espírito é água e é fogo. Como o pão se amassa com água e é assado ao fogo, assim também os fiéis, já dispostos pela penitência quaresmal, e pelas penitências do dia a dia, são levados pela ação do Espírito a unir-se a seus irmãos:

O Apóstolo diz, com efeito:
“há um só pão e nós, embora sendo muitos, formamos um só corpo. Assim explicou o sacramento da mesa do Senhor: somos muitos, mas somos um único pão, um único corpo. Neste pão, manifestai-vos como deveis amar a unidade. Porventura aquele pão foi feito de um único grão? Não eram muitos os grãos de trigo? Mas, antes que chegassem a ser pão, estavam separados. Por meio da água é que foram unidos, depois de certa moagem: porque, se o trigo não for moído e amassado com água, não chega à forma que se chama pão. Assim vós também, dias atrás, pela humilhação do jejum e pelo mistério do exorcismo, éreis como que moídos. Veio o Batismo e, pela água, fostes banhados para poderdes receber a forma de pão, mas ainda não há pão se não se passa pelo fogo”.

O que significa o fogo?
“Trata-se da unção do óleo. O fogo que nutre é o sacramento do Espírito Santo. Prestai atenção nos Atos dos
Apóstolos, ( ... ) vem, pois, o Espírito Santo: depois da água, o fogo e sois convertidos em pão, que é o Corpo de Cristo”.
“Se retirares a palavra, não há senão pão e vinho: acrescenta a palavra, e já há outra coisa. E essa outra coisa, o que é? O Corpo de Cristo e o Sangue de Cristo”.
Fazendo um belo jogo de palavras, Santo Agostinho explica que os que bebem juntos do cálice vivem juntos em concórdia.
Nobiscum hoc estis: simul enim hoc sumimus, simul bibimus, quia simul vivimus - Sois isto conosco: pois juntamente o consumimos, juntamente bebemos, porque vivemos juntos.
Por isso, Santo Agostinho fala da Eucaristia como o sacrifício de Deus e nosso. A Eucaristia é o sacrifício de Cristo oferecido ao Pai, a que cada fiel cristão se une por meio de Cristo e se oferece também ao Pai como uma oblação viva, santa e pura.

Unidade e não conformidade
Para Agostinho, a unidade não implica uniformidade, ou seja, que se faça tabula rasa de todos os dons e carismas recebidos. Trata-se de estabelecer uma igualdade verdadeiramente comunitária, que redimensiona a pessoa e a faz consciente da riqueza que a unidade lhe oferece, ajudando-a a libertar-se de elementos secundários  que podem converter-se em ídolos (raça, língua, família, país etc.), elementos que corremos o risco de querer adorar em lugar de Deus. Caindo, nos assim chamados "fundamentalismos.
Libertados desses elementos secundários capazes de escravizar a pessoa, o que procuramos é a unidade comunitária, na qual cada um pode e deve contribuir com sua própria particularidade, com o dom que recebeu de Deus, uma vez que todo dom se recebe sempre em vista de um serviço que se pode prestar a uma determinada comunidade. Uma comunidade é, portanto, como um tecido multicolorido, em que a unidade da trama não é quebrada pela variedade das cores.
Diz Santo Agostinho:
“Como a variedade de cores, num bordado, é tal que não se vê perturbada a graça da unidade, assim também, entre os irmãos, os diversos dons sejam tais que não se lhes adira qualquer discrepância de inveja”.
“Assim, tua alma não é própria, mas de todos os irmãos, cujas almas são tuas; ou melhor, cujas almas juntamente com a tua não são almas, mas uma única alma, a única de Cristo” ...
Viver da Eucaristia
Santo Agostinho indica com força a dimensão de graça que o Sacramento da Eucaristia possui. Quem quiser viver, já tem onde viver e de que viver: do Corpo e Sangue de Cristo. Para que o Sacramento seja fonte de vida, porém, é preciso aceitar as três condições que Santo Agostinho coloca como sinônimos da Eucaristia, numa das mais famosas frases agostinianas sobre ela:
Oh, sacramento de piedade! Oh, sinal de unidade!
Oh, vínculo de caridade! Quem quiser viver, tem onde viver, tem de que viver.
Aproxime-se, creia, para que faça parte deste Corpo, para que seja vivificado.
É preciso, portanto, viver o sacramento de piedade. Trata-se, por um lado, da manifestação da misericórdia de Deus aos homens (Sua condescendência), mas é, por outro lado, convite a que os seres humanos modelem sua vida piedosamente e  saibam sempre se dar a Deus, com fidelidade (colocar Deus sempre no centro da própria vida, do próprio coração).
A Eucaristia é ainda sinal de unidade, isto é, é penhor e exigência de unidade ao mesmo tempo. Recebe-se a unidade e a comunhão com Cristo Cabeça, como dizíamos antes, mas isso é também uma exigência de viver a comunhão com todos os membros do Corpo de Cristo.
Finalmente, a Eucaristia é vínculo de caridade. Recebe-se a caridade e cria-se um forte vínculo de amor ao se receber a Eucaristia. Quando isso é verdade, a vida do fiel está cheia da vitalidade de Deus, de Seu próprio amor, de Sua graça, e os demais elementos humanos passam todos ao segundo plano, pois o amor, a caridade, é a raiz da qual não podem brotar senão bons frutos:
“Ama e faze o que quiseres. Se te calas, cala-te movido pelo amor; se falas em tom alto, fala por amor; se corriges, corrige com amor; se perdoas, perdoa por amor. Tem no fundo do coração a raiz do amor: dessa raiz não pode sair senão o bem”!



Jornal Online “A Voz de Lourdes” – Julho de 2016
Compilação e Edição: Sérgio Bonadiman - Revisão e Publicação: Dermeval Neves
Responsabilidade: PASCOM Paróquia Nossa Senhora de Lourdes - Vila Hamburguesa - SP
Site da Paróquiahttp://www.pnslourdes.com.br