SOBRE A
UNIDADE NA IGREJA
Unidade
Um elemento muito presente nos
sermões pascais de Santo Agostinho com relação à Eucaristia é a unidade. Santo
Agostinho viveu numa Igreja que se encontrava dividida, principalmente por
causa do cisma donatista. Ele será, por isso, um grande amante da unidade e da
paz da Igreja e usará, diversas vezes, da imagem do Pão e do Vinho eucarísticos
para falar da unidade. Como o pão não se formou de um grão só, nem o vinho de
um único racimo de uva, assim também, em cada comunidade, há muitas pessoas.
Para que haja a unidade entre elas, contudo, é preciso que morra o próprio
'eu', para que possa nascer o 'nós'.
Santo Agostinho usa da imagem do
moinho para ilustrar as penitências, que levam os fiéis a "moer-se"
para morrer a si mesmos e unir-se aos demais, exatamente como ocorre com os
grãos de trigo no moinho, e para entrar em condições de unir-se pela ação do
Espírito Santo, pois o Espírito é água e é fogo. Como o pão se amassa com água
e é assado ao fogo, assim também os fiéis, já dispostos pela penitência
quaresmal, e pelas penitências do dia a dia, são levados pela ação do Espírito
a unir-se a seus irmãos:
O Apóstolo diz, com efeito:
“há um só pão e nós, embora sendo
muitos, formamos um só corpo. Assim explicou o sacramento da mesa do Senhor:
somos muitos, mas somos um único pão, um único corpo. Neste pão, manifestai-vos
como deveis amar a unidade. Porventura aquele pão foi feito de um único grão?
Não eram muitos os grãos de trigo? Mas, antes que chegassem a ser pão, estavam
separados. Por meio da água é que foram unidos, depois de certa moagem: porque,
se o trigo não for moído e amassado com água, não chega à forma que se chama
pão. Assim vós também, dias atrás, pela humilhação do jejum e pelo mistério do
exorcismo, éreis como que moídos. Veio o Batismo e, pela água, fostes banhados
para poderdes receber a forma de pão, mas ainda não há pão se não se passa pelo
fogo”.
O que significa o fogo?
“Trata-se da unção do óleo. O
fogo que nutre é o sacramento do Espírito Santo. Prestai atenção nos Atos dos
Apóstolos, ( ... ) vem, pois, o
Espírito Santo: depois da água, o fogo e sois convertidos em pão, que é o Corpo
de Cristo”.
“Se retirares a palavra, não há
senão pão e vinho: acrescenta a palavra, e já há outra coisa. E essa outra
coisa, o que é? O Corpo de Cristo e o Sangue de Cristo”.
Fazendo um belo jogo de palavras,
Santo Agostinho explica que os que bebem juntos do cálice vivem juntos em
concórdia.
Nobiscum hoc estis: simul enim
hoc sumimus, simul bibimus, quia simul vivimus - Sois isto conosco: pois
juntamente o consumimos, juntamente bebemos, porque vivemos juntos.
Por isso, Santo Agostinho fala da
Eucaristia como o sacrifício de Deus e nosso. A Eucaristia é o sacrifício de
Cristo oferecido ao Pai, a que cada fiel cristão se une por meio de Cristo e se
oferece também ao Pai como uma oblação viva, santa e pura.
Unidade e
não conformidade
Para Agostinho, a unidade não
implica uniformidade, ou seja, que se faça tabula rasa de todos os dons e
carismas recebidos. Trata-se de estabelecer uma igualdade verdadeiramente
comunitária, que redimensiona a pessoa e a faz consciente da riqueza que a
unidade lhe oferece, ajudando-a a libertar-se de elementos secundários
que podem converter-se em ídolos (raça, língua, família, país etc.),
elementos que corremos o risco de querer adorar em lugar de Deus. Caindo, nos
assim chamados "fundamentalismos.
Libertados desses elementos
secundários capazes de escravizar a pessoa, o que procuramos é a unidade
comunitária, na qual cada um pode e deve contribuir com sua própria
particularidade, com o dom que recebeu de Deus, uma vez que todo dom se recebe
sempre em vista de um serviço que se pode prestar a uma determinada comunidade.
Uma comunidade é, portanto, como um tecido multicolorido, em que a unidade da
trama não é quebrada pela variedade das cores.
Diz Santo Agostinho:
“Como a variedade de cores, num
bordado, é tal que não se vê perturbada a graça da unidade, assim também, entre
os irmãos, os diversos dons sejam tais que não se lhes adira qualquer
discrepância de inveja”.
“Assim, tua alma não é própria,
mas de todos os irmãos, cujas almas são tuas; ou melhor, cujas almas juntamente
com a tua não são almas, mas uma única alma, a única de Cristo” ...
Viver
da Eucaristia
Santo Agostinho indica com força
a dimensão de graça que o Sacramento da Eucaristia possui. Quem quiser viver,
já tem onde viver e de que viver: do Corpo e Sangue de Cristo. Para que o
Sacramento seja fonte de vida, porém, é preciso aceitar as três condições que
Santo Agostinho coloca como sinônimos da Eucaristia, numa das mais famosas
frases agostinianas sobre ela:
Oh, sacramento de piedade! Oh, sinal de unidade!
Oh, vínculo de caridade! Quem
quiser viver, tem onde viver, tem de que viver.
Aproxime-se, creia, para que faça parte deste Corpo, para que seja
vivificado.
É preciso, portanto, viver o
sacramento de piedade. Trata-se, por um lado, da manifestação da misericórdia
de Deus aos homens (Sua condescendência), mas é, por outro lado, convite a que
os seres humanos modelem sua vida piedosamente e saibam sempre se dar a
Deus, com fidelidade (colocar Deus sempre no centro da própria vida, do próprio
coração).
A Eucaristia é ainda sinal de
unidade, isto é, é penhor e exigência de unidade ao mesmo tempo. Recebe-se a
unidade e a comunhão com Cristo Cabeça, como dizíamos antes, mas isso é também
uma exigência de viver a comunhão com todos os membros do Corpo de Cristo.
Finalmente, a Eucaristia é
vínculo de caridade. Recebe-se a caridade e cria-se um forte vínculo de amor ao
se receber a Eucaristia. Quando isso é verdade, a vida do fiel está cheia da
vitalidade de Deus, de Seu próprio amor, de Sua graça, e os demais elementos
humanos passam todos ao segundo plano, pois o amor, a caridade, é a raiz da
qual não podem brotar senão bons frutos:
“Ama e faze o que quiseres. Se te
calas, cala-te movido pelo amor; se falas em tom alto, fala por amor; se
corriges, corrige com amor; se perdoas, perdoa por amor. Tem no fundo do
coração a raiz do amor: dessa raiz não pode sair senão o bem”!
Jornal Online “A Voz de Lourdes” – Julho de 2016
Responsabilidade: PASCOM Paróquia Nossa Senhora de Lourdes - Vila Hamburguesa - SP
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