segunda-feira, 1 de maio de 2017

MARIOLOGIA DE SANTO AGOSTINHO

O aspecto cristológico da Mariologia de Santo Agostinho


Santo Agostinho, um dos grandes padres da patrística latina[1], Bispo de Hipona, pai e fundador da família agostiniana, oferece-nos uma profunda reflexão acerca da Santíssima Virgem Maria. Suas reflexões sobre Maria estão presentes e permanecem na Igreja. O Bispo de Hipona não escreveu nenhuma obra exclusiva sobre Maria, porém, sua presença está marcada em seus sermões. Maria é, antes de tudo, mulher de fé. Em Santo Agostinho, os elogios tecidos à Virgem Maria possuem como intenção demarcar a fé da Igreja no Cristo, verdadeiro homem e verdadeiro Deus, dogma estabelecido no Concílio I de Constantinopla. Ao que parece é “Cipriano e Ambrósio que foram os que exerceram a máxima influencia sobre o pensamento mariano de Agostinho”[2]. Fazemos aceno, mesmo que rapidamente, sobre o tema da Theotókos.  

A expressão Theotókos surgiu no Oriente e ao contato com o ocidente, várias controvérsias começaram a surgir ao ponto do Concílio Primeiro de Éfeso (celebrado no ano de 431 e convocado pelo Imperador Teodósio) tratou sobre isso. Agostinho fora convidado, porém, falace antes (sua morte se deu em 28 de agosto de 430). Mesmo não estando presente corporeamente, seus escritos auxiliam os conciliares. O Concílio de Éfeso definiu que “Maria era a Theotókos (Mãe de Deus) e isto impulsionou a devoção mariana fazendo-a alcançar novas alturas”[3]. Santo Agostinho não se refere a Maria com esta terminologia grega, mas, tem em mente que ela é fato a mãe de Cristo.

Agostinho não se refere nunca a Maria como Deipara ou Dei Genitrix (termos latinos equivalentes ao grego Theotókos) e prefere tratar Maria como a “Mãe do Senhor” (Mater Domini). Os africanos preferiam geralmente o termo Mater Creatoris ou Mater Salvatoris[4].

O centro da Teologia agostiniana é Jesus. Tratar sobre Maria é, antes de tudo, preservar a Pessoa do Cristo, verdadeiramente Deus e homem. O tema da cooperação de Maria no plano de salvação é abundante em seus escritos. Para ele, sublinhar os privilégios de Maria é honrar o próprio Cristo, ou seja, “honrando Maria, honramos a Cristo. Este é o princípio fundamental e aspecto central do culto a Maria Santíssima na Igreja”[5]. Santo Agostinho destaca o carácter vivencial da fé de Maria. Ela é a síntese perfeita entre fé e vida. O célebre sermão 72 A, 7, o Bispo exorta os fieis sobre a passagem de Evangelho de Mateus 12, 47-50 onde Cristo exalta sua mãe e a denomina como feliz em fazer a vontade do Pai. Esta é a característica do verdadeiro seguidor de Jesus Cristo.

Prestai atenção, rogo-vos, meus irmãos, àquilo que o Cristo Senhor diz, estendendo a mão sobre seus discípulos: “Eis minha mãe e meus irmãos. Quem faz a vontade de meu Pai que me enviou, este é meu irmão, irmã e mãe (Mt 12, 49-50). Acaso, não fez a vontade do Pai a Virgem Maria que acreditou com fé (às palavras do Anjo) e que a fé concebeu; foi escolhida para que dela nascesse a salvação entre os homens; foi criada por Cristo, e antes de Cristo nela ter sido criado? Por certo, a santa Virgem Maria fez totalmente a vontade do Pai, e por isso mais valeu para ela ser discípula de Cristo do que a mãe de Cristo. Maior felicidade para ela ter sido discípula do que mãe. E assim, esta é uma bem aventurança, porque antes de dar à luz o Mestre, ela já o trazia em seu espírito[6].

Este Sermão fora proferido na Catedral de Hipona. Como exegeta que era, Agostinho afirma que Maria é mais feliz em ser discípula que em ser mãe do Senhor. Seguir ao Filho como discípula é mais importante que ser mãe do Senhor. Honrar a Maria, portanto, é imitá-la como seguidora já que não podemos gerar o filho. Este sermão mostra-nos uma delicadeza para com Maria. Mesmo que “não podemos falar que no Bispo de Hipona existe uma “alta mariologia” que predominou na Igreja desde tempos medievais”[7], admiramo-nos pelo requinte pastoral de sua mariologia.
Não havia naquele tempo nenhuma festividade mariana estabelecida no Norte da África, apesar da predileção local as pessoas por celebrações das festas dos mártires. O mais que Agostinho se aproxima das celebrações públicas de Maria era por ocasião das homilias do Natal do Senhor. O Natal não era somente uma festa da encarnação: era festa de Maria[8].
Podemos constatar neste sermão acerca da maternidade/discipulado de Maria, que Agostinho não tinha dúvidas de que ela é realmente a mãe de Jesus Cristo (por inteiro). Para defender isso ele recorre sempre as Sagradas Escrituras. Para compreendermos bem o aspecto cristológico, lembramos que a concepção virginal de Maria é núcleo primordial para a Teologia agostiniana. Maria é mãe de Cristo Total. Esta foi a conclusão de Éfeso Primeiro: “Santa Maria, mãe de Deus”.
As ideias matizadas de Agostinho sobre o tema (maternidade de Maria) têm de ser contempladas no contexto de sua minuciosa doutrina do Christus Totus que reconhece a existência de uma unidade radical entre Cristo, que é a cabeça e a Igreja, que é seu corpo[9].

Não iremos adentrar na temática do Cristo Total, somente tocá-lo para que vejamos a união evidenciada por Santo Agostinho entre a Divindade-humanidade de Jesus Cristo. Sobre a maternidade virginal de Maria, a expressão “Si enim falsa mater, falsa caro, falsa mors, falsa vulnera pasionis, falsae cicatrices ressurrectionis; non veritas credenes in eun, sed falsitas liberabit[10] (se não é uma mãe verdadeira, a carne é falsa, a morte é falsa, as feridas da paixão são falsas e falsas também são as cicatrizes da Ressurreição) mostra-nos que Maria é colaboradora do projeto divino de salvação e portanto, cooperadora. O gerar na fé é a participação de Maria na obra redentora de seu Filho; “Ela não foi um mero instrumento passivo, mas, pelas virtudes da fé, obediência e caridade, cooperou ativamente na obra da salvação”[11].

Frei Rhuam Ferreira Rodrigues de Almeida (OAR)
Teologado Santa Mônica (São Paulo-SP)




[1] Patrística é o nome dado à filosofia e teologia cristã católica dos três primeiros séculos, elaborada pelos Padres ou Pais da Igreja, daí "Patrística".
[2] FITZGERALD, Allan D. Diccionário de San Agustín: San Agustín a través del tiempoBurgos: Monte Carmelo, 1999, p. 851 (tradução livre do autor).
[3] Ibid., p. 851 (tradução livre do autor).
[4] Ibid., p. 851 (tradução livre do autor).
[5] AGOSTINHO, Santo. A Virgem Maria: cem textos marianos com comentários. Tradução de Nair de Assis Oliveira. São Paulo: Paulus, 1996, p. 78-79.
[6] Ibid., p.11.
[7] FITZGERALD, Allan D. Diccionário de San Agustín: San Agustín a través del tiempoBurgos: Monte Carmelo, 1999, p. 855 (tradução livre do autor).
[8] Ibid., p. 850 (tradução livre do autor).
[9] Ibid., p. 854 (tradução livre do autor).
[10] CAPÁNAGA, Victorino. La Virgen María según San Agustín. Roma: Tipografia Dominicana, 1956, p. 5 (tradução livre do autor).
[11] Ibid., p. 196 (tradução livre do autor).



Jornal Online “A Voz de Lourdes” – Maio de 2017
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