Para nós da Igreja do Brasil, desde de 1971, setembro tornou-se o MÊS DA BÍBLIA e,
já desde 1947, o último domingo do mesmo mês é comemorado como DIA DA BÍBLIA. Talvez nem fazemos ideia,
mas a Bíblia é o livro mais vendido, distribuído e impresso em toda a História
da humanidade. Só no século XX foram impressos mais de um bilhão e meio de
exemplares, em mais de mil e seiscentos idiomas diferentes, tornando-se o maior
“best-seller” de todos os tempos. Nunca a palavra de Deus foi tão meditada,
lida e comentada como em nossos dias.
Mas qual
é a origem da Bíblia? Para que serve? Como deve ser lida? Como rezar com a
Bíblia? São perguntas que procurarei responder nesse artigo, sem a pretensão de
esgotar o assunto, mas com a esperança de leva-los a amá-la como fonte de vida.
QUAL É ORIGEM DA BÍBLIA?
Ela é a
história de um povo com o seu Deus; não de qualquer povo, mas do povo de Deus,
escolhido por Ele, para ser exemplo para todos os povos. Ela nasceu no meio do
povo hebreu, no tempo de Abraão, na terra de Canaã, que em seguida chamou-se
terra de Israel e bem mais tarde Palestina.
A palavra
Bíblia provém do grego biblos e significa livros, o que bem demonstra não ser a
Bíblia um único livro. Assim, quando usamos hoje a palavra “Bíblia” nos
referimos a um conjunto de livros. Nela estão agrupados 73 livros, é uma
verdadeira mini-biblioteca que destaca o a aliança e plano de salvação de Deus
para com a humanidade.
E
justamente por não ser um livro, mas um conjunto de livros, a bíblia levou bem
mais de mil anos para ser escrita e tomar a forma de hoje, podemos identificar
em sua gestação, que ela passou por 3 fases:
– Os acontecimentos: antes de se
tornar um livro, a Bíblia foi uma realidade vivida e experimentada pelo homem.
A essência da Sagrada Escritura não está nas palavras que ela traz, mas nos
acontecimentos, nos fatos concretos e acontecimentos salvíficos.
– Tradição Oral: logo depois dos
Acontecimentos, entra em cena a Tradição Oral. Eles eram contados pelos pais e
mães aos filhos, de geração em geração. Esse período durou cerca de 900 anos.
Desta forma, o povo mantinha forte em sua lembrança as fortes experiências
vividas com Deus. “Lembra-te dos dias antigos, considera os anos das gerações
passadas. Interroga teu pai e ele te contará; teus anciãos e eles te dirão”
(Deuteronômio 32, 7). “Assim, pois, irmãos, ficai firmes e conservai os
ensinamentos que de nós aprendestes, seja por palavras, seja por carta nossa”
(2Tessalonicensess 2, 15);
– Tradição Escrita: quando possível,
devido às condições políticas, sociais e culturais da época, algumas pessoas
começaram a colocar por escrito as ricas e vastas experiências do povo eleito
de Deus. Graças a homens inspirados pelo Espírito de Santo, também chamados de
hagiógrafos, a Bíblia começou a ser escrita.
Vemos,
assim, que a Bíblia, ou melhor, os livros que a compõem foram escritos por
homens, mas inspirados por Deus, de forma a prevenir erros. O homem foi o
instrumento de Deus e foi movido e dirigido por Ele. No entanto, cabe aqui uma
importante observação: o fato de Deus ter inspirado homens a escreverem os
livros que compõem a bíblia, não significa que tenha anulado a inteligência e a
liberdade deles, veja o que nos diz o Magistério da Igreja a respeito disso:
“Na
redação dos livros sagrados, Deus escolheu homens, dos quais se serviu
fazendo-os usar suas próprias faculdades
e capacidades a fim de que, agindo Ele próprio neles e por eles
escrevessem, como verdadeiros autores, tudo e só aquilo que Ele próprio
quisesse” (Dei Verbum, 11).
PARA QUE SERVE A BÍBLIA?
Na Bíblia
é o próprio Deus que se revela a nós através de sua Palavra. Por isso devemos
“acolher a palavra de Deus, não como palavra humana, mas como mensagem de Deus,
o que ela é em verdade”. Ela é “viva, eficaz, mais penetrante do que uma espada
de dois gumes e atinge até a divisão da alma e do corpo, das juntas e medulas,
e discerne os pensamentos e intenções do coração” (Hebreus 4, 12). Além disso
“toda a Escritura é inspirada por Deus, e útil para ensinar, para repreender,
para corrigir e para formar na justiça. Por ela, o homem de Deus se torna
perfeito, capacitado para toda boa obra” (2Timóteo 3, 16)
Ela serve
para que as pessoas creiam em Cristo (João 20, 30 – 31), para ajudar os
cristãos a caminharem (Salmo 118(119), 105), para nossa instrução (1Coríntios
10, 11) e para ajudar-nos a instruir, refutar, corrigir e educar na justiça
(2Timóteo 3, 16).
São
Jerônimo (+ 420) dizia: “Desconhecer as Sagradas Escrituras é ignorar o próprio
Jesus Cristo”. Santa Teresinha do Menino Jesus, falando do Evangelho, escreveu:
“Acima de tudo, o que me sustenta durante a oração é o evangelho. Nele encontro
tudo o que necessita minha pobre alma. Nele continuamente descubro novas luzes
e sentidos ocultos e misteriosos” (Ms A 83v).
No
entanto, não basta conhecer a Bíblia, é preciso coloca-la em prática de maneira
fiel e criativa (Tiago 1, 22). A Bíblia precisa tornar-se fonte da nossa força,
luz de nossa caminhada e objetivo de nosso trabalho.
COMO DEVE SER LIDA?
A Bíblia
é a Palavra Viva de Deus. Precisamos ter a consciência de que “toda Escritura é
inspirada por Deus” (2Timoteo 3, 16), “que nenhuma profecia da Escritura é de
interpretação pessoal” (2Pedro 1, 20) e também de que “nelas há algumas
passagens difíceis de entender, cujo sentido os espíritos ignorantes ou pouco
fortalecidos deturpam, para a sua própria ruína, como o fazem também com as
demais Escrituras” (2Pedro 3, 16b). No Concílio Ecumênico Vaticano II lemos
que: “…para bem captar o sentido dos textos sagrados, deve-se atender com não
menor diligência ao conteúdo e à unidade de toda a Escritura, levada em conta a
Tradição viva da Igreja toda e a analogia da fé” (Dei Verbum 12).
Com isso
vemos que não devemos ler a bíblia como se estivéssemos lendo um livro
qualquer, mas sua leitura exige respeito, humildade e prudência.
Por isso
é muito importante buscarmos participar de Círculo bíblico, cursos de bíblia,
etc, que facilmente podemos encontrar em nossas comunidades, paróquias e
dioceses.
COMO REZAR COM A BÍBLIA?
Frei
Patrício Sciadini, OCD, aponta 3 atitudes fundamentais que precisamos ter
dentro de nós quando nos aproximamos da Sagrada Escritura: “ela deve ser lida:
lenta, atenta e amorosamente”. Ele explica cada uma delas:
1.
Lentamente: não somos acostumados
a ler lentamente. Hoje temos quase uma “voracidade compulsiva” em ler muito.
Há, poderíamos dizer, um “engordamento artificial” de ideias que não
conseguimos digerir. É muito importante na oração evitar essa fome de palavra,
ter mais cuidado na escolha do que lemos e ler mais lentamente, quase
saboreando palavra por palavra, repartindo as palavras como se fossem uma fruta
que queremos saborear e não apenas engolir;
2.
Atentamente: prestar atenção ao
que se diz ou se lê. Para Santa Teresa, este é o segredo da verdadeira
meditação. É preciso, diz ela, saber o que diz e para quem diz, para que seja
verdadeira oração. A mesma pedagogia devemos usar quando queremos compreender o
que estamos lendo para poder penetrar no seu sentido. Três perguntas podem ser
úteis aqui: “O que diz a Palavra? Para quem é dirigida? O que diz para mim
hoje?”. Essa releitura da Palavra é fundamental para, diante dela, não nos
portar como espectadores ou visitantes de um museu, mas atualizá-la para a
nossa vida.
3.
Amorosamente: ler com amor, como
se a Palavra ou texto fosse dirigido tão somente a nós. Essa personalização da
Palavra é fundamental para que possamos ser “tocados” pelo espírito do autor
que, quando escreveu, tinha uma finalidade: sermos gerados pela Palavra ouvida
e meditada. Quando lemos algo com amor, isso produz mais fruto dentro de nós.
Alguns
passos simples para ler e meditar um texto bíblico poderiam ser os 4 passos da Lectio Divina. Busque um lugar
tranqüilo, onde você possa criar um ambiente calmo e recolhido, com silêncio ou
música de fundo, como for melhor, assim feito siga:
1. Leitura: Nesse
passo você deve ler, reler, confrontar passagens paralelas; interpretar
símbolos, ver personagens; quem fala, como fala, a quem fala, quando fala, onde
fala, como agem e reagem as personagens. Nesse passo você deve procurar
responder: Que diz o texto?
2. Meditação: Que
valores profundos me evoca o texto? Que sinto ou experimento, como reajo ao ler
este texto? Com que relaciono o texto? Existem duas fases, na meditação, a
primeira de recolher, juntar, reservar sem preguiça; a segunda de ruminar,
digerir tudo o que se recolhe; deixar que as palavras se liguem entre si; criar
clima, atenção, calor; preocupar-se para que nada te roube a Palavra…
Discernir, confrontar e deixar que as palavras que recolheste, guardaste e
observaste, se clarifiquem umas às outras. Feito isto, a Palavra faz o resto.
Nesse passo você deve procurar responder: Que me diz o Senhor neste texto?
3. Oração: Em
silêncio, pela palavra, pelo canto, pelo gesto, que digo ao Senhor? Que
palavras, canto, silêncio ou gesto me provoca a Palavra que acabei de ler e meditar?
Para esse passo busco responder: Que digo eu ao Senhor que me fala neste texto?
4. Contemplação: Agora é
o momento de observar os efeitos dessa palavra sobre você, sobre a sua vida.
Responda aqui: Que sinto em mim? Que experiência me é dada viver agora?
Você pode
estar se perguntando: mas por onde devo começar a leitura? Que livro ler
primeiro? Devo ler o Antigo ou o Novo Testamento? Bem, há muitos livros
católicos com sugestões de leituras, mas uma opção bem eficaz e tradicional é a
Liturgia Diária, ela traz as leituras que em cada dia a Igreja medita na
Liturgia Eucarística.
E AGORA?
Eis uma
regra de ouro que aprendi: Ler a Bíblia todos os dias. “Feliz aquele que se
compraz no serviço do Senhor e medita sua lei dia e noite” (Salmo 1, 2). Ler
todos os dias sem exceção. Ler quando estiver com vontade, quando sentir falta,
mas também quando não estiver com vontade nenhuma. Assim como você alimenta o
corpo todos os dias, deve também alimentar diariamente o seu espírito com a
Palavra de Deus.
Então, o
que é que você está esperando? Inclua a leitura da Bíblia no seu dia-a-dia,
reze com ela e descubra as maravilhas que Deus deseja lhe contar